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   FARMACOGENÉTICA E MEDICINA DE PRECISÃO


  Publicado em 12/11/2021


Terapias medicamentosas para variados tipos de condições patológicas podem ocasionar respostas variáveis entre indivíduos, ou seja, com uma mesma dosagem de um fármaco, muitas vezes o efeito que um indivíduo sente não é igual ao de outro. Essa variação é multifatorial, pois depende de fatores como interações alimentares, sexo, hábitos de vida, idade e genética1. O estudo de variantes genéticas que influenciam na resposta a fármacos é denominado Farmacogenética ou Farmacogenômica, que propõe a chamada medicina de precisão, adequada ao perfil genético de cada paciente. Uma abordagem terapêutica personalizada pode aumentar a eficácia do tratamento proposto, reduzir o risco de reações adversas e muitas vezes reduzir custos do tratamento2.


Não são todos os fármacos e genes que apresentam importância na farmacogenética. Algumas variantes em genes específicos apresentam bastante evidência para aplicação na clínica, outras são menos importantes até o momento. As variantes que apresentam uma quantidade expressiva de evidência e efeitos suficientemente fortes são denominadas "genótipos clinicamente acionáveis", ou "clinically actionable genotypes (CAGs)", que compreendem variantes em diversos genes, especialmente alguns que codificam enzimas do complexo citocromo P450, como CYP2C19 (com clopidogrel) e CYP2D6 (com codeína), por exemplo (https://cpicpgx.org/genes-drugs/).


Uma das principais ideias da farmacogenética é atuar na medicina preventiva, realizando testes de variantes com nível elevado de evidência antes da administração do fármaco, prevendo o tipo de metabolismo do indivíduo analisado. Para alguns genes, há o chamado activity score, que classifica as variantes em nulas, intermediárias, extensivas (normais) ou ultrarrápidas 3. Dependendo do conjunto de variantes que um indivíduo apresenta (são detectadas no teste farmacogenético), ele pode ser classificado como metabolizador lento, intermediário, extensivo, rápido ou ultrarrápido, e essa classificação prevê como será a resposta ao tratamento pretendido.


Vale ressaltar que, no caso do anticoagulante varfarina (um dos mais prescritos no mundo), já existem algoritmos para cálculo de dosagem individual. Tais algoritmos levam em consideração dados genéticos, interação com outros fármacos, estado de saúde do paciente e ancestralidade ( http://www.warfarindosing.org ). A dose necessária para a sustentação da concentração plasmática do fármaco na faixa terapêutica difere entre etnias; em geral, afro-americanos requerem uma dose maior do que a necessária para indivíduos asiáticos, enquanto brancos necessitam de dose intermediária 4. A ancestralidade cada vez se mostra mais importante em estudos de farmacogenética, pois já foi associada com algumas variantes de relevância clínica 5. Apesar disso, dados em populações não europeias ainda são escassos quando comparados com dados de populações europeias, portanto ainda há um caminho a ser percorrido em pesquisas nesse contexto.


A farmacogenética já tem sido implementada na clínica especialmente por esforços como a iniciativa CPIC (The Clinical Pharmacogenetics Implementation Consortium), um consórcio internacional criado em 2011 que fornece gratuitamente guias de dosagem de acordo perfil genético do paciente para direcionar profissional em prescrições com maior eficácia (https://cpicpgx.org/). As guias CPIC, tais como as informações do site PharmGKB ( https://www.pharmgkb.org/ ) são padronizadas como as principais fontes de informações farmacogenéticas, e podem ser utilizadas para pesquisa científica ou aplicação na rotina clínica.


Nossos grupos de pesquisa, o meu e o do Prof. Eduardo Tarazona Santos, participam ativamente na Rede Iberoamericana de Farmacogenética ( http://www.redribef.com/ ), que tem como objetivo estudar a farmacogenéticas das populações latino-americanas e promover suas aplicações nos sistemas de saúde do continente americano5.

Referências

  1. Ma Q, Lu AYH. Pharmacogenetics, Pharmacogenomics, and Individualized Medicine. Sibley DR, editor. Pharmacol Rev. 2011 Jun;63(2):437-59.
  2. Suarez-Kurtz G. Pharmacogenetic testing in oncology: a Brazilian perspective. Clinics. 2018 Oct;73(Suppl 1):1-12.
  3. Gaedigk A, Simon S, Pearce R, Bradford L, Kennedy M, Leeder J. The CYP2D6 Activity Score: Translating Genotype Information into a Qualitative Measure of Phenotype. Clin Pharmacol Ther [Internet]. 2008 Feb [cited 2018 Jun 10];83(2):234-42. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/17971818
  4. Urban TJ. Race, Ethnicity, Ancestry, and Pharmacogenetics. Mt Sinai J Med A J Transl Pers Med. 2010 Mar;77(2):133-9.
  5. Rodrigues-Soares F, Peñas-Lledó EM, Tarazona-Santos E, Sosa-Macías M, Terán E, López-López M, et al. Genomic Ancestry, CYP2D6, CYP2C9, and CYP2C19 Among Latin Americans. Clin Pharmacol Ther [Internet]. 2020 Jan 1 [cited 2021 May 5];107(1):257-68. Available from: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/31376146/


 Texto escrito por:


FERNANDA RODRIGUES SOARES, PhD (UFTM)
Bióloga, Mestre e Doutora em Genética.
Currículo lattes